Pedro Laurentino: condenado a pagar indenização por erguer a voz contra os intocáveis privilégios da aristocracia local
No dia 04 de junho, no início da noite, com a inspiração que nunca lhe falta, o escritor e poeta Pedro Laurentino, ilustre lutador, defensor das causas e classes populares, ex-vereador, escreveu em sua rede social (Facebook), um texto interessante e reflexivo . Confiram.
Tudo que juntei foi só pra ladrão (Elomar)
Corria o ano de 2002 e eu, teimando em combater os moinhos da injustiça cavalgando um mísero cavalo de pau, lancei-me candidato ao senado pelo PDT do Piauí, com chances zero de lograr êxito eleitoral. Era eu então vereador de Teresina e o PFL de Hugo e Leda Napoleão reinava absoluto no Estado, para deleite dos oportunistas, adesistas e jornalistas que não se cansavam de aplaudi-los e locupletarem-se com as delícias do poder, conforme afirmação do próprio governador à época.
Os filhinhos de papai sob o sol do Equador, nascidos em berço de ouro, praticavam o gracioso esporte de prestar exame vestibular em qualquer faculdade caça-níquel do país ou até do estrangeiro e, ato contínuo, serem transferidos para os cursos de Medicina e Direito da Universidade Estadual do Piauí (UESPI) - pública e gratuita - garantindo um diploma e um futuro promissor às custas do sacrifício e do suor do bravo e pobre povo piauiense, cujos filhos raramente tinham acesso aos bancos de uma faculdade.
O escândalo tomou tal proporção, que os acadêmicos de medicina decretaram greve por não aceitarem mais partilhar a mesma sala e o mesmo curso com figurinhas carimbadas do high society, que não saíam das baladas e das colunas sociais, mas que ingressavam na universidade pela nada honrada porta dos fundos, sob os mais estapafúrdios pretextos.
Instado pelos estudantes à época, coloquei o meu programa eleitoral à disposição da causa. Durante mais de 15 dias, initerruptamente, foram denunciados e divulgados os nomes de todos que conspurcaram o processo de seleção pública da Universidade Estadual do Piauí.
Como era de se esperar um dos denunciados - filho de uma das mais poderosas famílias do estado, com ramificações e influências na política, nos negócios e no judiciário - moveu uma ação de danos morais contra a minha pessoa e contra os partidos coligados.
Nesses 15 anos, fui sucessivamente derrotado e condenado em todas as instâncias da Justiça do meu estado a pagar uma absurda indenização ao autor, numa estranha lógica onde o difamador é quem defende a coisa pública e o difamado é quem se apropria graciosamente dela. Corrigida aos dias atuais e somada aos honorários advocatícios, esse pobre poeta-funcionário teria que pagar cerca de 100 mil reais para reparar o seu atrevimento e aprender a nunca mais erguer a voz contra os intocáveis privilégios da aristocracia local.
Como estou longe de acumular tal riqueza e o único bem penhorável que possuo - um veículo que não chega a metade desse valor - iria fatalmente a leilão, rendi-me à evidência dos fatos, oferecendo para acordo alguns parcos caraminguás que eu havia juntado para cobrir às despesas com a edição do meu próximo livro de poesia. O acordo foi prontamente aceito, lavrado pelos advogados e homologado pelo juiz. E assim caminha a clava forte da justiça no árido sertão piauiense e em todo iníquo solo pátrio.
Refleti muito antes de tornar público esse episódio. Mas acho que por trazer lições e aprendizados, é meu dever divulgá-lo. Até porque silenciar, seria uma demonstração de desânimo e derrota. E essa não é propriamente a sensação que me domina. Pelo contrário, arde em meu peito a chama acesa na sólida lenha do dever cumprido... e publicar esse texto só renova a denúncia.
Quanto ao livro, mais cedo ou mais tarde há de vir, que a poesia brota feito água e sempre encontra um caminho para se derramar.
Que venham mais moinhos!!!
'O lema
é a justiça e não a vingança
pra que se deixe de herança
uma multidão de esperança
a debochar das algemas'